A mulher 
cava com a mão esquerda
o paredão

mete unha no fundo da rocha
a outra mão ora busca 
escorar-se na lua
ora cair para o frouxo lugar de sua masmorra
lá no sopé ao longe, 
agora das miniaturas

seus ombros em constante briga
ela chacoalha 
as contradições são físicas e movimentam

por vezes escorrega três metros
em um dia
para os sete que conquistou em um mês

o queixo é quem dita o avanço
enfia-se nos espasmos das pedras

a boca beija os musgos escondidos
nas dobras de cada áspero trecho
do chão vertical

toda sua pele se descasca
e se recria a cada chuva braba

toma jeito de lagarta
se alimenta dos cactos
e um gole d’água - de olho seu
sobrevive

vez em quando uma moleza
de olhar pra baixo e ver
a confortável cela

milhares das suas
muito amadas
luzem romances
panos-de-prato e xaxins
no comando do carcereiro

esperam que ele jogue sobre seu dorso machucado
uns farelos carinhosos
na sopa rala de anteontem

a mulher mete unha contra a saudade
e sobe ao alcance dos pássaros
pelo paraíso que desconhece

o doce descampado das fugitivas