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Homem Invisível Objeto Invisível

O homem invisível -objeto invisível (Performance)

Se você passou pelo marco zero de São Paulo, lá na Praça da Sé, no dia 15 de fevereiro de 2001, pode até ter sido um dos felizardos a não assistir a uma performance pública de Túlio Tavares. Isso mesmo, não assistir. E olha que ele se esforçou para chamar a atenção, armado de um poderoso mega¬fone e de um indiscretíssimo objeto criado pelo artista plástico Ricardo Basbaum.
Durante o primeiro dos dois dias que durou o experimento, Túlio discursou praticamente para si mesmo, pois as pessoas que pas¬savam apressadas nem sequer notavam sua presença. Fotos e vídeos re¬gistraram essa situação.
No segundo e último dia, o roteiro da performance foi modificado. Em vez de fazer de um discurso hermético, Túlio procurou incentivar a participação dos transeuntes, propondo a eles as mesmas questões do dia anterior, só que agora em um discurso muito mais compatível com o universo do cidadão comum. Aceitaram a provocação aposentados, desempregados, garis, pastores, boys.
Mozart Mesquita

Momento 1 – O invisível
(Túlio Tavares) Hoje vamos discutir duas coisas, a visibilidade do discurso artístico e a visibilidade do ser humano. Na verdade, essa performance já aconteceu duas semanas atrás em uma outra quinta-feira. A gente passou aqui mais de uma hora, uma hora e meia, tentando colocar se eu era uma pessoa visível ou se eu era invisível, eu continuo acreditando que eu sou invisível e vocês vão passar por mim hoje e não vão entender nada do que está acontecendo. Sendo assim, se por acaso não tiver uma experiência na mente de vocês, se isso não for levado como uma informação, eu continuo invisível.
Para confirmar esse discurso que eu estou propondo para a cidade – este é um discurso para cidade de São Paulo – eu trouxe um objeto de arte produzido pelo artista Ricardo Basbaum, que segue por diferentes casas, por diferentes pessoas, que interagem com esse objeto. Hoje, eu resolvi trazer comigo, para tentar diminuir, então, minha invisibilidade.
Morando numa cidade como São Paulo, nós somos colocados no quase imperceptível. Cada pessoa que está passando aqui hoje na praça da Sé, não está olhando ao lado, as pessoas ao lado não são visíveis. Se vocês notarem bem, em frente àquela igreja, há duas semanas, tinha uma mancha de sangue, provavelmente alguém foi morto naquela mancha, e mesmo assim, isso foi uma ação invisível. Apesar de eu estar falando com um megafone no marco zero da cidade de São Paulo, onde as linhas se cruzam, norte, sul, leste, oeste, ninguém vai prestar atenção no que eu estou falando. Então, a gente pode continuar nesta perspectiva da invisibilidade. Eu não sei se concordam ou se não, alguém poderia vir aqui e falar: não, você não é invisível, o que você está falando é importante para mim, vou levar para casa como uma experiência.
(Não houve público.)
Momento 2 – O visível
(Pastor) A mensagem que eu quero passar, a mensagem que Jesus Cristo veio passar, todos vocês que se encontra invisível para o mundo, o que vocês têm que fazer é chamar ao senhor Jesus Cristo, o autor e consumador da fé, ele que é o caminho, a verdade e a vida, ele mesmo falou em um de seus sermões dizendo, eu sou a luz do mundo. Então você que quer sair da escuridão, aceite Jesus Cristo como seu salvador, venha pâra a luz e deixe de ser invisível, para ser visível, para a glória de Deus.
Vivemos em um país em que nós podemos perceber que há muitas pessoas invisíveis dentro da sociedade, do poder político, quantas pessoas estão à margem da sociedade, mendigando, invisíveis perante a sociedade, quer dizer, para os grandes, são o lixo da sociedade.
(Senhora gari) Parece um caixão.
(Túlio) Parece um caixão? Mas caixão não tem tampa?
(Senhora gari) Nem todo caixão tem tampa.
(Túlio) O caixão é de madeira, esse é de ferro. Que a senhora acha por ser de ferro?
(Senhora gari) É bom que dura mais.
(Túlio) Dura mais?
(Senhor 1) Aqui no Brasil é raro, posso ser invisível toda hora, porque aquele que tem, nem olha para mim, outros passam pela gente, fazem que não conhecem, então, para essa pessoa eu sou invisível, eu não sou nem gente. Não é verdade, principalmente no Brasil? Mas para muitos sou visível, porque tem muitos com algum poder aquisitivo que passa, fala e me cumprimenta. Então, eu sou invisível para muitos e visível para muitos, esse é meu modo de entender.
(Senhor 2) O homem é igual ao urubu. O urubu só baixa onde tem carne, e o homem só baixa onde ele leva vantagem. O homem já fez essa parede aí já com a intenção de levar vantagem.
(Túlio) Ah, é?
(Senhor 2) Mas é claro, o homem fez isso para quê? Tá tudo podre.
(Túlio) O senhor acha que a arte tá podre?
(Senhor 2) A arte não tá podre, ela precisa ter mais perfeição dentro da humanidade para entender.
(Pessoa de meia-idade) As várias visões sobre o mesmo objeto é que enquadram uma consciência, só isso.
(Senhor 2) Nada é nada, continua nada vezes nada.
(Túlio) Como é o olho do senhor?
(Senhor 2) Se eu não tenho olho, eu não posso ter ilusão. Eu vou ter ilusão de que, se eu não vi nada?. O cego não pode ter ilusão. Como ele tem ilusão? Ele não viu nada!
(Túlio) Perfeito! Quer dizer que o cego não tem ilusão? Isso é interessante.
(Senhor 2) Ele tem ilusão numa troca de idéias, de outros que enxergam com ele, mas ele mesmo não viu nada.
(Túlio) Eu queria fazer uma pergunta para o senhora… tá vendo aquele objeto ali? Se a senhora levasse para casa, que sua família ia dizer?
(Senhora) Que eu tava loca.
(Túlio) Quer dizer que se a senhora leva aquilo lá, o pessoal ia dizer que a senhora tava doidona?
(Senhora) Tava doidona mesmo.
(Túlio) Ah é?
(Senhora) Da praça da Sé até Vila Nova Galvão, o que você acha? Olha o que eu já tô levando, batata-palha.
(Túlio) Batata-palha? A senhora trabalha vendendo batata-palha?
(Senhora) Não, é para uma festinha de criança.
(O público começou a aglomerar.)
Momento 3 – os homens invisíveis e a batalha final
(Túlio) O que o senhor acha que as pessoas tão ganhando com essa discussão aqui? Eu queria colocar para todo mundo que a gente tá discutindo sobre aquele objeto ali na frente e que toda nossa conversa partiu por causa dele e se a gente era invisível ou não. O que o senhor acha que as pessoas estão ganhando aqui com a gente?
(Senhor 2) O povo? Curiosidade… O povo por aqui para, não entende nada, é curiosidade, tá tudo curioso. Curiosidade é uma coisa, compreensão definitiva que conhece, é poucos.Você não vê os crentes, ficam tudo ali falando não sei o que, fica assim de gente, mas, na verdade, tudo curioso, tudo curioso, porque nenhum entende nada, os próprios crentes, a filosofia deles é falha.
(Morador de rua) Pára de zombar dos crente, seu miserável, pára de zombar dos crente lá! Você é bosta! Você é um miserável, você é um velho, você não passa de um verme, você é velho, você não tem que ficar zombando dos crente, seu velho desgraçado, os crente tá falando a verdade!
(senhor 2) Crente falando a verdade…Você já viu crente falando a verdade?
(Túlio) Eu acho que eles falam a verdade deles sim.
(Senhor 2) À moda deles… A opinião deles.
(Morador de rua) Você já tá caducando!
(Senhor 2) Esse é um coitado, esse não sabe nada, esse é um bobo alegre, um bosta…
(Havia muito público.)
Fotos Marcos Vilas Boas
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