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A Universidade de Coimbra está viva

A Universidade de Coimbra está viva
Crónica por Beatriz Rodrigues
 
 
Foi sob o olhar atento dos 18 reis retratados na Sala dos Capelos que se realizou a Abertura Solene do ano lectivo de 2013/2014. Num ambiente de solenidade reforçado pelos rostos sisudos dispostos em volta da sala, ouviram-se os discursos do Reitor da Universidade de Coimbra, João Gabriel Silva, e do Presidente da Direcção Geral da Associação Académica de Coimbra, Ricardo Morgado. Como não podia deixar de acontecer na abertura de um novo ano académico, o Reitor discursou com convicção enquanto mais de uma centena de olhos o olhavam como se a esperança na Universidade estivesse depositada em si, a representação máxima da instituição. Começando por saudar a classificação de Património Mundial pela Unesco da Universidade, Alta e Sofia, João Gabriel Silva efectuou numerosos agradecimentos a quem a tornou possível, referindo ainda a relevância do marco, já que coincide com os 500 anos de existência da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra. Claramente orgulhoso, mencionou que para ele, assim como para tantos outros cidadãos conimbricenses, Coimbra é o símbolo máximo da cultura portuguesa, símbolo de língua, saber e conhecimento. Não foi portanto estranho ouvir o reitor proferir que é necessário tirar partido da classificação da Unesco: cuidar do património físico, potenciar o turismo e as suas receitas e aproveitar a condição da instituição como referência da Língua Portuguesa são as estratégias do reitor licenciado e doutorado pela Universidade que hoje comanda. O discurso transformou-se então numa dura crítica aos cortes de financiamento efectuados pelo governo português. João Gabriel Silva sublinhou o contraste entre o reconhecimento externo e interno da Universidade de Coimbra. Ao mesmo tempo que a Universidade é reconhecida internacionalmente como uma das melhores do mundo, condição confirmada pela entrada da UC no Top 500 de Shanghai, em que apenas figuram mais duas universidades portuguesas, a nível nacional a instituição é sujeita a cortes de orçamento que, nas palavras do reitor, são “insanos”. Em finais do mês de Setembro, ainda não é conhecido o orçamento do corrente ano lectivo, esperando-se uma redução ainda maior no orçamento da instituição, que no ano passado verificou uma redução efectiva de 3,18 milhões de euros. Várias cabeças assentiram em redor da sala quando o discurso se focou na questão das receitas próprias da Universidade. Uma directiva da Direcção Geral do Orçamento proíbe as instituições de Ensino Superior de aumentar o peso das receitas próprias nos seus orçamentos, mantendo, assim, níveis semelhantes aos de 2012. O reitor referiu que sem receitas próprias a instituição já estaria em colapso, e olhando para o fundo da sala fez a promessa de que “o governo encontrará em nós um parceiro, mas inabalável” no que se refere a este assunto. “A crise não nos consegue parar”, foram as palavras proferidas imediatamente antes de agradecer aos reitores das várias faculdades por terem encontrado soluções para as muitas dificuldades enfrentadas ao longo do último ano. Em jeito de conclusão, saudaram-se os resultados das colocações da primeira fase do concurso ao Ensino Superior e enumeraram-se os múltiplos esforços realizados no sentido de melhorar os apoios sociais a alunos carenciados. Destacou-se a criação do PASEC, o novo programa assegurado pelos Serviços Académicos que permite que estudantes tenham as propinas e refeições pagas a troco de trabalhar para a Universidade de Coimbra em bibliotecas e cantinas, por exemplo. Na conclusão da sua intervenção, João Gabriel Silva reforçou a promessa de não fraquejar. Olhando estudantes e docentes nos olhos relembrou a palavra dominante na sua tomada de posse, pedindo «optimismo».
Subiu então os imponentes degraus conducentes ao palanque colocado junto à cadeira do reitor, o Presidente da Direcção Geral da Associação Académica de Coimbra. Ricardo Morgado começou por referir que a Abertura Solene do ano lectivo deve constituir um momento de reflexão e de reforço das convicções, especialmente após um ano particularmente difícil para o país, os portugueses e a Universidade. Mais uma vez se reforçaram os cortes feitos no orçamento das Universidades. “Ainda não saímos da crise”, disse o Presidente da Associação Académica pousando o olhar nos estudantes presentes na sala. Em seguida, e dirigindo-se ao reitor, Ricardo Morgado defendeu que a Acção Social tem de ser reforçada. Com menos vinte mil bolseiros em Portugal desde 2005 e sendo a Universidade de Coimbra a instituição de Ensino Superior com a propina mais alta de Portugal, o representante dos alunos sublinhou que são necessárias mais bolsas e apoios sociais, reafirmando que continuará a defender os interesses dos estudantes e a realidade de uma universidade mais justa. Num momento de quase auto-jubilação, o Presidente da Direcção Geral da AAC comunicou que em 2013 conseguiu reduzir em mais de metade o passivo da Associação Académica, saudando ainda o total diálogo e cooperação com a Universidade de Coimbra no último ano. Num pedido para o futuro, referiu que gostaria de ver mais trabalho nos apoios do SASUC e pediu a todos que continuem a cuidar e respeitar o matrimónio imaterial de Coimbra, como a cultura das repúblicas e a canção coimbrã. Dirigindo-se aos novos estudantes, desejou um bom ano lectivo, repleto de sucessos pessoais e colectivos, referindo ainda que “ ser estudante da Universidade de Coimbra é aceitar um desafio”. Com estas palavras se despediu, não sem antes lançar um olhar a todos na sala, traçando a sua capa enquanto descia os degraus que há quase vinte minutos tinha subido.
A Abertura Solene do ano lectivo não terminaria sem a Oração de Sapiência proferida por Santos Justo, decano da Faculdade de Direito e uma figura de referência para o Direito Português. Exaustiva, como é costume nestes eventos, a Oração de Sapiência levou docentes, funcionários e estudantes até à era dos reis, os mesmos que durante toda a sessão se mantiveram de olhos postos lá em baixo. Estava aberto o ano lectivo, com mensagens de esperança e crítica social, mostrando que apesar dos muitos ataques à Instituição, a Universidade de Coimbra se encontra não só inabalável, mas acima de tudo, viva.
 
 
 
A Universidade de Coimbra está viva
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A Universidade de Coimbra está viva

Crónica sobre a abertura solene das aulas do ano letivo de 2013/2014 da Universidade de Coimbra.

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