Mulher Drag Queen

As mulheres também estão no universo da performance artística e política dos transformistas

Por Giovanna Hilário

Quando se pensa em Drag Queens, a ideia de que um homem esteja por baixo de toda aquela produção é a primeira que vem à cabeça. Mas e se eu te disser que, por baixo de toda aquela maquiagem, perucas, roupas espalhafatosas também pode haver uma mulher?!

O fato de interpretar uma Drag Queen não está ligado ao gênero e muito menos à sexualidade. A arte da performance possibilita um ato político e artístico, um modo de conscientizar as pessoas, que traz um papel questionador e sensibiliza os indivíduos. Pensar que apenas certos gêneros possam interpretar outros papéis ou realizar certas profissões já virou ideia do passado.

Em Brasília, atualmente, o coletivo Distrito Drag, criado há dois anos, reúne 49 performers com o objetivo de propagar a arte drag e a cultura LGBT+, além de realizar e promover cursos, seminários, oficinas, palestras, fóruns de debates e encontros que atendam as necessidades de aprofundamento dos temas relevantes para pessoas LGBT+ e Drag Queens.

Não há um número exato de quantas Drags existem no Brasil, mas no carnaval, tal número aumenta consideravelmente, uma vez que as drags denominadas by chance (as que não se caracterizam habitualmente) circulam nesses ambientes. Normalmente datas como essa chamam atenção para o público que além de querer se divertir , gosta de apreciar essa arte. Para a rotina, clubes e bares são normalmente onde muitas drag queens atuam profissionalmente em shows, interpretando suas criações. Outras têm empregos em tempo integral.

E falando em carnaval, a segunda edição do Bloco das Montadas ocorreu no dia 03 de Março no Setor Bancário Norte, os organizadores desse bloco são do Coletivo Distrito Drag . Na primeira edição, ano passado, cerca de 15 mil foliões foram puxados atrás do trio pelas ruas de Brasília. Neste ano, o bloco triplicou e recebeu 45 mil pessoas. A festa tem como intuito celebrar a diversidade e o respeito. Durante o evento, drag queens animavam o bloco na pista e no palco.

Mas que tal um pouco de história para entender como tudo começou? Partimos para muito antes daqui, uns 500 anos antes de Cristo, na Grécia. Acompanhe a linha do tempo no final da matéria.

Lugar de cada uma

Foi em uma noite em uma das boates, mais conhecida como Victoria Haus, que Rebeca Cavalcanti decidiu mudar o rumo de sua vida. Ao presenciar mais um show performado por diversas Drags no palco, Rebeca tinha certeza de que queria não ser só uma telespectadora naquele ambiente, mas queria fazer parte dele. “A ideia da Drag veio à tona justamente quando eu conheci uma drag queen e, até então, eu tinha aquele mundo de longe, eu já sabia o que era, mas assim nunca tinha chegado tão perto. E quando eu comecei a fazer parte daquele universo eu fiquei ‘Gente! Pera aí! Eu quero isso pra mim”.

Rebeca Cavalcanti apresentado um tributo a Amy Winehouse no La Rubia Café.
Para Rebeca começar a performar foi um processo de autoaceitação, nunca havia se visto dentro dos padrões. E quando conheceu esse novo universo, sentiu que estava em um lugar onde poderia ser ela mesma. “Nunca me conformei de ser aquela menina enquadrada nos padrões”, ela afirma. Para ela, a sua Drag Queen, mais conhecida como Amy Fame, trouxe tudo aquilo que ela não tinha coragem de mostrar, ela lhe trouxe segurança, “Quando eu tô lá no palco, ali é a Amy e não mais a Rebeca que tem uma segurança, a minha drag me ajuda a quebrar barreiras”.

Muitas mulheres passaram a estar presentes dentro dessa arte por buscarem empoderamento da autoestima, para se libertar dos padrões da sociedade. Mesmo assim, essa arte ainda é vista com maus olhos por pessoas de fora e até mesmo do próprio meio LGBT+, devido ao machismo dentro da sociedade.

Segundo o professor Paulo Petronilio, do Programa de Pós-graduação em Performances Culturais, drag queen não é orientação sexual nem identidade de gênero, mas, sim, uma expressão artística.

Ele acredita que a questão do preconceito com as pessoas que se envolvem com essa arte não está só ligada ao machismo mas também à cultura instalada no país. “Ela é uma figura subversiva, subverte os binarismos instaurados na nossa cultura heteronormativa e compulsória. Tem a ver com machismo e também com o preconceito de fato em relação à própria drag, que confunde, que embaralha as nossas referências, que areja e ao mesmo tempo nos permite pensar outros dispositivos da sexualidade”. Outro fator seria o próprio preconceito com a performance da drag que costuma questionar alguns pontos ligados à sexualidade e gênero.

Naiara Lira, mais conhecida com Tóxica Pirigótica, percebeu que, quando se monta e deixa o corpo feminino exposto, não é tão bem aceita como quando se monta mais “monstra”, com todo o conceito de fantasia em que o corpo não fica tão visível. O fato de ser mulher precisa ser camuflado. Além disso, já ouviu comentários do tipo “Eu não sabia que mulher podia ser Drag Queen” e ela responde “Mano, mulher pode ser o que ela quiser, inclusive Drag Queen!”

O termo Drag Queen se caracteriza pela pessoa que se veste com roupas exageradas femininas estilizadas. A transformação geralmente envolve a criação de um personagem cômico ou exagerado. Pensar que uma mulher, por ser cisgênero, e interpretar essa performance possui vantagens é um equívoco. Essa arte busca o exagero da sua criação, “A Drag se baseia em três pilares: que é a do feminino, que é o do exagero e que é o dessa coisa monstra, fantasiosa”, afirma Naiara. Para Rebeca, a drag representa a ideia da brincadeira com o próprio gênero feminino, “Ela é um exagero do gênero, é uma brincadeira, uma brincadeira de trazer a quebra de padrões impostos ao gênero feminino”.

O entrar no drag ou no personagem pode levar horas. Uma drag queen pode apontar para um certo estilo, impressão de celebridades ou mensagem com seu visual. O cabelo, a maquiagem e os trajes são os fundamentos mais importantes para drag queens. Drag queens tendem a procurar um olhar mais exagerado com muito mais maquiagem do que uma mulher feminina típica se vestiria.

Mesmo com o preconceito, essas mulheres superam os sofrimentos e continuam performando com paixão pela arte. O documentário “THEY CAN DO IT”, dirigido por Kelviane Lima, mostra a história de seis mulheres na cidade de São Paulo que resolveram aderir à arte drag e passaram a se montar e se apresentar em eventos pela capital.

Mas, dentro do mundo drag, há preconceito contra as mulheres que se montam por parte das próprias colegas. Ouça o relato de Naiara e Rebeca no nosso podcast.

Seja para ter uma carreira integral, sair para se divertir, para autoaceitação ou até mesmo uma brincadeira, a arte Drag está presente para todos, independentemente do gênero ou da sexualidade. E esse é mais um espaço que as mulheres estão conquistando.

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