. Nós, etiquetas .

Fotos para o projeto Nós, etiquetas, realizado juntamente com o grupo de fotografia amadora olharesingulares, em 2010. As fotos ilustram trechos do poema Eu, etiqueta, de Carlos Drummond de Andrade.
Nós, etiquetas

No poema Eu, etiqueta, Carlos Drummond de Andrade afirmou: “Eu sou a coisa, coisamente”. Hoje em dia, talvez não exista cidadão consumidor consciente que não compartilhe com o poeta dessa estranha sensação. Assim como Drummond, o sociólogo francês Jean Baudrillard, por exemplo, acreditava que, da mesma forma que o menino se transforma em lobo à força de conviver com lobos, nós nos tornamos objetos a medida em que nos cercamos cada vez mais de objetos. Nós nos coisificamos.

Atualmente, a principal finalidade do esforço produtivo da sociedade industrial é criar condições para que se possa consumir cada vez mais. Consumir, consumir e consumir ainda é o propósito mais valorizado.

Mas, ter um belo corpo, atraente e jovem, é tão importante quanto a marca das roupas e acessórios que se pode comprar. A todo momento, por meio da publicidade, da moda, da TV, das vitrines espalhadas pela cidade, dos outdoors e das logomarcas gigantescas na paisagem urbana, somos convidados a desejar consumir. E, assim, consumir para nos sentirmos mais desejados.

Porém, nesse cenário, nada disso é tão intrigante quanto o manequim. Sem dúvida, os manequins das lojas, que nos espreitam a espera da nossa atenção reproduzindo vaidosamente o jeito humano, guardam algum parentesco com as estátuas gregas do século IV a.C. Metade humanos, metade objetos de culto, esses fazem parte da mitologia cotidiana do mundo pós-moderno. Por meio deles, a nossa fascinação natural pela beleza física e disposição exacerbada para o consumo combinam-se e materializam-se diante dos nossos olhos, num espetáculo colorido de expressões e formas assustadoramente sedutoras e vazias.

Presos à condição de objetos, o que diriam se pudessem falar? Versos!?

Emmanuel Guedes de Toledo
NÓS, ETIQUETAS
Published: