comecei este autorretrato bordado no começo de 2022 e eu ainda não o finalizei. o tempo que levo junto com ele não tem nada a ver com técnica, aprimoramento, tamanho ou dificuldade de execução..

acontece que volto para o bordado como quem volta para os braços de uma comunidade de cura depois da guerra.

para onde voltam aqueles que estão no front expondo seus corpos nas batalhas? 

voltam para as curandeiras, as bruxas, as médicas, as que sabem fazer os feitiços de cura, os chás.. 

voltam para onde podem receber afetos, cuidado, carinho...
eu volto para o tecido, para a linha, para o bordado.
volto para este lugar onde posso ser INTEIRA.

por isso é a frase de audre lorde que molda a base do meu rosto. suas palavras me lembram que por mais que durante a "guerra" tenham tentado destruir partes de mim que não parecem ser "produtivas", "interessantes", "lucrativas", eu não as abandonarei.

repito isso para as minhas amigas, então também bordo o nome de algumas delas...

a minha inteireza é composta da cidade e da sua verticalização que pesam nos meus olhos, mas também da natureza, das montanhas, da lua, das minhas lágrimas, do meu sangue... é composta do meu interesse pelo místico, pela astrologia e também pela minha obsessão pela arte.

há em mim muita luta e também muita fé.

então minhas amigas, sempre haverá alguém tentando usar uma parte de vocês e, ao mesmo tempo, as encorajandoa esquecer ou destruir todas as outras. E AÍ VAI UM AVISO: ISSO É A MORTE! a morte como mulher, a morte como poeta,a morte como ser humano.