Há quem diga que Curitiba se ressente por sua pobreza de identidade, sua ausência de narrativa passada que suscite o saudável orgulho regionalista que outras cidades possuem. Bom, na minha consciência, esse problema não passa de uma miragem – afinal, a paisagem que habito me constitui, e talvez só seja necessário que escavemos esses alicerces coletivamente. Nesse esforço o Edifício Cerro Luar toma parte – projeto residencial para o bairro Cajuru, ele se volta para os cumes da Serra do Mar e intrinsicamente afirma: é essa a terra que vivemos.
O prédio parte de um conjunto de reflexões. A primeira e mais vital na definição do partido foi a paisagem mencionada. Escalonando na direção leste, o prédio em cada andar oferece terraços comunitários nos quais a vista da Serra do Mar é predominante, reunindo atividades coletivas em torno dessa relação compartilhada com o lugar – a da cidade com suas montanhas.
O edifício oferece quatro tipologias de apartamentos entre 60 e 85 m² com programas tradicionais (sala de estar e jantar, cozinha, banheiro e dois ou três quartos), atentando para as diversificadas constituições familiares do bairro Cajuru. A distribuição de espaços foi feita com a dignidade do gênero humano em primeiro plano – queríamos nos afastar o máximo possível do espaço enclausurado que aliena, oprime. É desse modo que a própria configuração dos apartamentos também é um manifesto, um em prol da visão que posiciona a vida como virtude máxima, e não a arrecadação por metro quadrado.
Uma segunda reflexão é a generosidade da arquitetura com o local. No térreo, as transições entre público e privado não são violentas como os muros prevalentes nas edificações do bairro – de fato, são sutis, psicológicas, realizadas por artifícios de desenho (desníveis e degraus, canteiros e pisos) que, por mais idealistas que sejam, adquirem valor em sua insistência em imaginar um futuro que vale a pena. Dessas decisões, o projeto busca intensificar a relação do usuário com o espaço – sua vizinhança, cidade e paisagem.
Os terraços comunitários atuam como catalisadores da vida social do edifício. Espaços privilegiados tanto por sua generosidade formal quanto pela relação com o horizonte sublime, a definição de uma dinâmica coletiva, não-privada, infere que a dimensão local (representada pela própria Serra) constitui sim uma identidade compartilhada.
