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Afeto que vem do barro: os traços da cerâmica marajoara que unem a Família
Sant'ana
Camilla Rosário
Dentre as mais diversas heranças deixadas pelos povos indígenas, a cerâmica marajoara é uma das que perduram até hoje fortemente no cotidiano amazônida. Seja com vasos, pratos, brincos ou colares, os produtos de cerâmica embelezam qualquer espaço com seus traços únicos e suas mais variadas formas, além de contarem uma história de resistência e valorização cultural. Esta prática tem sido realizada desde 1975 por Mestre Sant’ana, o que resultou no empreendimento Cerâmica Família Sant’ana. A olaria mistura tradição e valorização histórico-cultural dessa herança tão importante para a região. 

A Cerâmica Família Sant’ana é uma loja/olaria movida pelo desejo de dar continuidade ao ofício herdado da família e também ao consumo da tecnologia mais antiga e inteligente descoberta pelo homem. Foi fundada por Guilherme Sant’ana, mais conhecido como Mestre Sant’ana e hoje, além de um empreendimento, também é um espaço fraternal, composto por Marly Sant’ana, esposa de Guilherme, Maynara Sant’ana, filha de Marly e Guilherme, Sebastian Santos, companheiro de Maynara, e Madson Almeida, aprendiz dos processos cerâmicos da família. 

A loja da família Sant’ana fica localizada no distrito de Icoaraci, em Belém, que hoje é referência na produção e divulgação da cerâmica indígena. Cerca de 90% da comunidade de ceramistas está localizada no bairro do Paracuri, centro de Icoaraci, onde a atividade gera renda para famílias inteiras. Para Mestre Sant’ana, a cerâmica é o elo de ligação fraternal que existe entre a sua família. “Antes era só eu. A partir do momento em que o Sebastian, a Maynara, a Marly vieram fazer parte desse ofício, ele se tornou o que nos une de maneira mais ampla. Os nossos afetos estão ligados à produção de cerâmica. Tudo o que nós fazemos é voltado para esse ofício que acaba se tornando, pra gente, uma coisa muito prazerosa e que nos dá muita felicidade. Fico muito feliz de fazer o que a gente faz, e podendo estar dentro desse universo nos confraternizando como família”, conta o ceramista. 

O ofício da cerâmica entrou na Família Sant’ana através da mãe de Guilherme, que durante muitos anos trabalhou na olaria mais antiga do distrito de Icoaraci. A importância de seguir com esta tradição é muito mais do que apenas dar continuidade ao legado familiar, mas também é sobre continuar repassando e transmitindo a riqueza cultural e histórica amazônica. “É importante porque é uma cultura que é muito nossa, então a gente tem a esperança de que isso passe para as futuras gerações. Não só as da minha família, mas de uma boa parte das famílias que habitam em Icoaraci. A cerâmica tem uma história muito longeva, muito bonita, então nós temos uma meta bem ambiciosa de que a gente possa passar a outras pessoas da comunidade esse ofício que é tão bonito e tão prazeroso de se fazer”, acrescenta Mestre Sant’ana. 

Os produtos desenvolvidos pela olaria da família exalam a energia e o respeito à tarefa de dimensionar as infinitas possibilidades do uso da cerâmica, sem deixar de lado a tendência de serem inovadores e também as características da arte local. “A gente trabalha com inovação, mas algumas características da cerâmica daqui a gente acaba fazendo questão de usar porque elas são muito emblemáticas. Elas identificam a nossa cerâmica como se fosse uma espécie de DNA. A cerâmica é um vetor muito grande de conhecimento da nossa região”, explica Guilherme. 

A cerâmica é um produto que interage com o meio ambiente sem agredi-lo, além de produzir variados tipos de artefatos e objetos, o que a torna uma ótima opção de presente, por exemplo. E para facilitar a compra e venda de objetos da loja, a Cerâmica Família Sant’ana passou a oferecer também a oportunidade de compras on-line em canais como WhatsApp e Instagram, onde são disponibilizados seus diversos produtos. As redes sociais da loja são administradas pela filha de Guilherme, Maynara Sant’ana, que também é apaixonada por cerâmica marajoara e pretende seguir os passos de seu pai. “Eu acho que os povos marajoaras, os povos daqui dessa região foram diferentes. E essa importância, essa história e essa paixão precisam ser levadas para todas as pessoas que queiram ser atingidas por esse afeto que existe no barro”, relata Maynara. 

Além da loja, a Família Sant’ana também realiza oficinas que possam ajudar a renovar a mão-de-obra de pessoas que trabalhem no ofício e preservar etapas e estilos de cerâmica produzidas no passado. “Aqui, a tradição da cerâmica é passada de pai para filho, só que nos últimos anos isso não foi incentivado. E dentro desse processo, a gente percebeu a importância de estar formando novos profissionais que não queiram só trabalhar com cerâmica pra ganhar dinheiro, mas profissionais que vejam o valor, o bem viver e a importância de trabalhar com algo que é cultural”, afirma Maynara. 

A Cerâmica Família Sant’ana reforça e valoriza a singularidade da cultura paraense por meio da herança familiar aliada ao empreendedorismo local. “O Pará é diferente. Tem muita coisa que pulsa, e pulsa com uma criatividade, uma originalidade muito grande. E das coisas que pulsam, eu me atrevo a eleger três que são muito nossas: a comida, a música e a cerâmica”, encerra Maynara Sant’ana.
CONECTA estimula o olhar sobre cultura geek e tecnologia na Amazônia
Camilla Rosário
A cultura pop e a tecnologia estarão em pauta entre os dias 11 e 13 de março de 2022 durante a Convenção Nerd de Cultura e Tecnologia da Amazônia, a CONECTA. O evento é idealizado pelo Grupo Nerds Paraenses. A CONECTA ocorre em diversos espaços da Fundação Cultural do Pará, antigo Centur, e traz uma programação repleta de atividades educativas e culturais. 

A CONECTA é produto da necessidade do Grupo Nerds Paraenses de fazer uma convenção multicultural com o objetivo de quebrar bolhas formadas entre as diferentes vertentes da cultura pop. O grupo venceu o Prêmio Aceleradora de Comunidades do Facebook, que ajuda líderes de comunidades em todo o mundo a transformar ideias em ação, e se tornou o primeiro grupo da Amazônia a ser contemplado. O evento traz palestras, rodas de conversa, lançamentos de livros, apresentações musicais, e muito mais para valorizar, destacar e debater as principais formas de produções de cultura pop no Pará. 

Para Diego Borges, idealizador do evento, a importância da CONECTA é mostrar que a Amazônia também consome cultura pop, assim como o resto do Brasil. Por isso, se fez tão importante a necessidade de debater sobre a produção cultural, principalmente no Estado do Pará. “O diferencial é trazer o autor paraense, o produtor de cultura paraense para o centro do debate. A nossa ideia é colocar eles em pé de igualdade com as atrações do cenário nacional e do cenário mundial da cultura pop como um todo”, conta Diego. 

A diferença da valorização entre a produção cultural feita na Amazônia e a feita mais ao sul do Brasil é um dos tópicos que rodeiam a realização do evento. A CONECTA chega como um pedido de visibilidade e incentivo ao que o Norte produz. “Por que a cultura produzida no sul e sudeste é considerada ‘cultura nacional’ e o que a gente produz no norte e nordeste é ‘cultura regional’, já que é tudo cultura? Então a importância de um evento como a CONECTA vem para mostrar que tudo é cultura. Que a gente tá produzindo cultura pop, terror, fantasia, literatura do mesmo jeitinho que o resto do Brasil. É pra mostrar pro cenário nacional, pro resto do país que a gente tá aqui”, questiona Diego. 

A convenção, que começa nesta sexta-feira (11), terá programações variadas e divididas em quatro espaços. Neles, estarão presentes grandes nomes da cultura paraense e nacional como Affonso Solano e Leonel Caldela, que realizam palestras e falam sobre seus livros, e Ricardo Cruz, Bruno Sutter e AQNO, que animam ainda mais o espaço com suas músicas. Além disso, diferentes temáticas também serão abordadas em rodas de conversa, como a que Lua Barros, produtora de conteúdo paraense, levará ao terceiro e último dia de evento: “A mudança na representação de heroínas sáficas em séries de TV”. 

Ela e muitas outras personalidades que estarão presentes na CONECTA anseiam pela realização do evento e os resultados que podem ser gerados. “Eu acredito que a CONECTA finalmente dará visibilidade aos autores, ilustradores, criadores e fãs paraenses e nortistas. Raramente vemos nossas produções ganhando o país e até mesmo nossa cidade, e isso acontece porque não fazemos ideia das pessoas brilhantes que estão criando
histórias por aqui. Então, eu estou imensamente feliz e ansiosa para conhecer e interagir com todo mundo”, afirma Lua. 

Ainda sobre a importância de destacar as produções nortistas, Lua Barros também comenta: “As histórias criadas por nós falam sobre nós. São histórias de terror com pessoas correndo e gritando 'corre mano que é visagem' ou histórias de super heróis que de dia batem açaí e a noite protegem a cidade de forças sobrenaturais. E ao lermos ou assistirmos essas histórias percebemos o quão linda é a nossa cultura, e o quão ela precisa ser valorizada! Sem contar que ao termos contato com histórias assim, percebemos que podemos sim levar nossa cultura, nossa escrita e nossos traços para outros lugares e fazer com que outras pessoas se apaixonem pelos nossos heróis e protagonistas.” 

Além da cultura, a tecnologia também será debatida e executada durante a programação. Isso porque ter e compartilhar conhecimento, fundamental para ultrapassar as barreiras da definição de ‘cultura geek’, é inerente à ferramenta. “Vamos ter lançamentos de tecnologia, palestras de games e assim por diante para mostrar que a gente também produz tecnologia agregada a cultura. Todo pilar que a gente prega no [Grupo] Nerds é a cultura como ferramenta de inclusão, e essa inclusão passa pela tecnologia”, acrescenta o idealizador do evento. 

A primeira edição da convenção, além de muita diversão e conhecimento, também carrega consigo o poder de transformação e valorização. “A Amazônia entra nesse contexto como consumidora e produtora de histórias, e a CONECTA provará isso da melhor maneira, colocando os holofotes nos autores e nos fãs, criando um lugar acolhedor, divertido e com muita representatividade”, encerra Lua Barros. 
Cenário político brasileiro e saúde mental compõem “mais ou menos”, novo EP da banda Antes do Erro
Camilla Rosário
Lançado na última semana, o novo trabalho da banda Antes do Erro traz reflexões sobre questões atuais e relevantes na sociedade e no país. As três músicas que compõem o EP possuem influências de bandas como Dead Fish, Bad Religion e Chuva Negra, que brincam com o hardcore melódico e o punk rock. O EP “mais ou menos” já está disponível nas principais plataformas de streaming. 

Formada em 2014, a banda Antes do Erro é composta por Caio Alves no vocal, Patrick Porto na guitarra, Victor Alves na bateria, e Alberto Ernande no baixo, mas nem sempre teve esse nome. O vocalista conta que anteriormente a banda se chamava Archote, mas que já havia uma banda no Sul do país com o mesmo nome registrado. A banda sulista entrou em contato com a banda paraense e foi preciso renomeá-la. "Tínhamos um show marcado e começamos a correr atrás de nomes. No desespero, muitos nomes ruins eram sugeridos, então eu disse que a gente tinha que ter calma e pensar em um bom nome antes que a gente erre. A frase bateu forte e logo foi sugerido 'Antes do Erro'", afirma Caio. 

Com uma discografia composta por um EP, “Crônicas do Mar Revolto”, lançado em 2015, e um álbum, “New Kids On The Black Bloc”, de 2018, agora a Antes do Erro lança “mais ou menos” e dá continuidade a abordagem de temas que já eram pautas em trabalhos anteriores. O inédito do novo EP é a presença da fala sobre a política brasileira, o conservadorismo e como as relações sociais foram afetadas após as eleições de 2018. 

As composições da banda são majoritariamente da autoria de Caio e são reflexos de coisas que acontecem com ele ou ao seu redor e acabam o inspirando. Sobre as temáticas presentes nas músicas de "mais ou menos", o músico revela: "Eu como uma pessoa comum, como qualquer outra, não consegui fugir do caos mental que vem desde as eleições de 2018, pandemia… Os últimos três anos foram muito conturbados e eles são o motivo das letras do 'mais ou menos'. Senti na pele ou presenciei com amigos tudo que está escrito e gritado no EP". 

Caio descreve o EP "mais ou menos" como um "ode ao ordinário, música simples, feito por pessoas simples para pessoas simples". As músicas, além de falarem sobre o cenário pós-eleições de 2018, também debatem sobre as dificuldades enfrentadas por uma pessoa que sofre de transtornos como ansiedade e depressão, e precisa que seus problemas sejam enfrentados de maneira séria e importante. "Eu nunca sei o que pensar sobre como as pessoas vão interpretar o significado das músicas. Espero estar ajudando alguém de alguma forma com elas", acrescenta o cantor. 
"mais ou menos" é um grito de liberdade e desabafo, um verdadeiro ode ao ordinário. Para o futuro, a banda promete o segundo álbum de estúdio e encontrar o público presencialmente. "O EP é uma pequena amostra do futuro musical da banda, a gente já está em processo de composição para a gravação do nosso segundo álbum cheio. Vamos intercalar com o processo de composição com os shows de divulgação do EP, se a pandemia deixar, a gente gosta muito de tocar, principalmente viajar pra tocar", encerra Caio.
Sebastião Tapajós e seu legado histórico na cena musical paraense
Camilla Rosário
Foi carregando a cultura amazônica na sua arte que Sebastião Tapajós tornou-se um dos maiores violonistas do mundo. Nascido Sebastião Pena Marcião, escolheu “Tapajós” como nome artístico para homenagear o rio de onde saiu para conquistar uma carreira de extremo sucesso e prestígio através do carimbó, da guitarrada e do samba. Com formação europeia, o paraense repassou seus conhecimentos obtidos nas academias de Portugal e da Espanha aos alunos do Conservatório Carlos Gomes de Belém, onde lecionava violão clássico. 

Especialista em utilizar percussões e variações de timbres, Tapajós lançou mais de 50 discos que hoje eternizam sua grandeza artística, incluindo “Encontro com a saudade”, “Instrumental caboclo”, “Solos da Amazônia” e “Solos do Brasil”, resultados do seu interesse pelos diferentes ritmos da Amazônia. Além disso, também criou uma vertente do violão brasileiro que combina o clássico e o popular com o folclore regional ao dedicar-se à pesquisa de música popular e folclórica. 

Em 1992, foi eleito o Melhor Músico Brasileiro pela Academia Brasileira de Letras e em 2017, teve seu nome adicionado a um instituto que busca divulgar e sistematizar sua produção musical, além de promover ações para a conservação da biodiversidade da floresta Amazônica, enfrentar problemas de saúde pública e realizar projetos sociais e culturais para crianças, como o ensino de música. 

Com 72 anos, Sebastião Tapajós deixou um legado e uma ferida imensuráveis no cenário da música brasileira e da cultura feita no Pará. E como a estrela que sempre foi, continuará abrilhantando o mundo inteiro com seu talento imortal. Sebastião Tapajós presente!
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