Henrique Bitelo's profile

arrastões e manchas

arrastão
& manchas
A partir da intenção de fazer mídias diferentes interagirem adentrei em uma pesquisa em pós-produção, apropriação e interações entre mídias. Deixando o registro autoral e a criação desde um material bruto de lado, busquei utilizar de produções culturais em circulação no mundo que já possuem uma forma configurada ou um sentido definido para criações artísticas. Com isso, as noções de originalidade e mesmo de invenção, de fazer a partir do nada, vão se dissolvendo em uma nova paisagem cultural. 
gesto (2022)
colagem digital
As fronteiras entre recepção e prática são atenuadas para gerar novas cartografias do saber e do fazer. Me inspirando em figuras como do DJ e do programador, com suas tarefas de selecionar objetos culturais e reinseri-los em novos contextos, busco navegar pelas produções existentes para realizar reciclagens, fazer dialogar e distorcer diferentes contextos, lugares e tempos mediante recombinações artísticas e tecnológicas. A partir das utilizações a criação vai ganhando significados e, com empréstimos e reciclagens visuais, a operação artística vai se convertendo em ato conceitual e performativo. 
ciborgue (2022)
colagem digital
Com o surgimento de novas mídias e expansão das mídias tradicionais através da tecnologia, vou pensando as artes como ilhas de edição que podem subverter e oportunizar interações entre diferentes formas sociais, linguagens e modos de expressão. As sobreposições de tecnologias e meios foram contaminando os processos artísticos, ocorrendo deslocamentos, incorporações, hibridizações.
cidade-expandida (2022)
colagem digital
Minha ferramenta principal de criação se tornou o computador, que em um período curto de tempo foi se distanciando de seu propósito inicial de mastigar números e hoje mastiga todas as linguagens. Digerido-as em um fluxo incessante de dados, bytes, informações. Imagens, sons, discursos e ideias são reprocessadas e retransmitidas transpondo os repertórios tradicionais de se fazer arte. O acesso à apropriação, recombinação e compartilhamento de conteúdos possibilita que todo tipo de dado, em qualquer formato, seja traduzido para uma mesma linguagem: a digital. 

@ artista desprograma e reprograma, corta e cola, sampleia e remixa, disponibilizando novos usos possíveis das técnicas e ferramentas que se tem à disposição. A reutilização, recontextualização e recombinação, muitas vezes, vai trair seus propósitos originais. Sendo assim, são compostos discursos próprios através dessas bricolagens. A ação do artista contemporâneo vai se associando a ação do hacker, que pelo ato desviante vai explorar os limites do que é considerado possível ou admissível, afirmando o livre acesso à informação e a produção colaborativa.

Estas novas maneiras de se trabalhar com som, texto, informação e imagem não fazem ser necessário ter como referência, copiar ou representar o mundo real: o ato criador e as produções intermídias se encontram com o inesperado, com a multiplicidade e com a diferença. Pode-se habitar diversos estilos e formas historicizadas, utilizá-los como repertórios criativos dedicados à produção de singularidades e de sentidos diferentes a partir da aglomeração caótica das referências do cotidiano. Essas maneiras de criar são contaminadas pelas diferentes ideias, experiências, sotaques, corpos e formatos; fazem surgir artes expandidas, práticas monstruosas, fluxos artísticos, mutações e desvios.
saudade (2022)
produção sonora composta a partir de samples da nossa eterna Elza Soares. 
o vídeo é um circuit bending experimental reativo à música, 
criando uma rede de interação entre as mídias através do TouchDesigner.
Assim, as obras de arte funcionam como um término provisório de uma rede de elementos que se prolonga, aciona e reinterpreta redes anteriores. Podendo ser inseridas em múltiplos enredos não mais como ponto final e contradizendo a arte da cultura “passiva”. É através da colaboração de artistas e espectadores em um papel ativo que os sentidos e efeitos vão emergir; podendo ser múltiplos, contraditórios, falhos e imprevistos. Essas ambiguidades e neblinas são potências e polifonias que podem ser utilizadas como composição poética e resistência política

O que surge dessas composições sugerem cada vez mais agenciamentos que quebram os formatos. Encontram-se novas mídias cheias de possibilidades que são mediadas pelo uso do computador, desenvolvendo novas linguagens artísticas que aproximam ciência e arte para propor jogos poéticos. A partir de suas maleabilidades e interatividades encontram-se oportunidades de gerar sentidos voláteis e múltiplos com participação ativa do usuário-espectador. Possibilita emergir novas perspectivas construídas na integração de repertórios estéticos, tecnológicos e culturais.
Amparado em composições baseadas na instabilidade, na gambiarra, na conjugação do high tech e do low tech, na reutilização da sinfonia cotidiana do lixo civilizado e estética do arrastão de Tom Zé, podemos expropriar o capital cultural como maneira de contaminação poética e resistência política para invenção de mundos-outros. Essa estética do arrastão ou estética do plágio, trazida no texto presente no encarte do disco “Com Defeito de Fabricação” (1998) de Tom Zé, traz o arrastão como potência criativa: tomar de assalto coletivamente aquilo de valioso que se encontra nas diversas pessoas que cruzam o caminho por onde se passa. Através da combinação tudo se contamina e se transforma. Assim, desviamos a criação de um caminho predeterminado e a inserimos em um contexto amplo podendo dialogar e utilizar diferentes ferramentas para se produzir, habitar outras formas e as subverter para ativar as potências ali presentes.
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Com essas perspectivas, temos produções como colagens e criações sonoras que já se encontram nesse universo da pós-produção e apropriação de uma maneira mais estabilizada nas criações artísticas. Além disso, iniciei experimentações realizando a interação entre mídias diferentes, como na composição da videoarte de saudade. Nela, criei uma rede utilizando o TouchDesigner onde o vídeo reagia ao áudio, assim utilizando de algumas frequências presentes na música para manipular, distorcer ou movimentar alguns aspectos do vídeo; criando, assim, esse circuit bending áudio reativo.

Outra maneira de realizar essa interação entre áudio e imagem foi com a realização de desenhos controlados por música. Utilizando da técnica de pontilismo das artes visuais, consegui trazer as frequências sonoras para manipular a presença/ausência de pontos, assim como sua opacidade. Realizei o desenho de um círculo que se inicia na parte central superior do quadro e vai sendo movimentando em sentido horário.  Os pontos presentes nas margens do círculo são desenhados pelas frequências sonoras mais agudas e os pontos mais centrais pelas frequências sonoras mais graves. 

Aqui trago como exemplo a capa de meu novo EP chamado difração, onde utilizei as músicas que povoam o disco para controlar o desenho desse círculo. Esta é a soma dos quatro círculos resultantes das músicas.
capa do EP "difração" que estará disponível para streaming ainda no ano de 2022.
Busquei, também, transportar técnicas de uma mídia em outra e esse é o caso da minha experimentação com a técnica de slitscan vinda da fotografia e do hackeamento de scanner para produção de imagens distorcidas e diferentes das originais

Aqui estão alguns exemplos de utilizações de vídeos e trecho de filme como matéria-prima para composição de slitscans fotográficos: 

1. Receita Rápida - Anelis Assumpção
2. Sem Cais - Juçara Marçal
3. Poesía Sin Fin - Alejandro Jodorowsky
4. Lotus Flower - Radiohead ​​​​​​​
A partir desse primeiro experimento, comecei a perceber a potência ainda presente em produções videográficas que a técnica de slitscan fazia emergir, trazendo uma maior duração do pixel e a mancha do movimento e da cor.

Esse é o caso do resultado proporcionado com a utilização do slitscan no clipe de Não vou deixar, de Caetano Veloso, e de Lotus Flower, do Radiohead.
A técnica de slitscan foi trazida para o digital através da criação de uma rede interativa dentro do TouchDesigner.
slitscan realizado no clipe de "Lotus Flower", do Radiohead.
Este projeto continua em desenvolvimento, em experimentação e interações. Principalmente com a minha pesquisa de dissertação no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e Institucional da UFRGS, onde pesquiso como a performance artística pode ser uma operadora de transformações das relações de performers com seus corpos, gêneros e sexualidade; na intersecção entre psicologia social, artes e política. Mas, também, a partir das misturas das ideias e produções atuais com a performance, as artes generativas, videoartes, projeções mapeadas e experiências como VJ.
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