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Reggae: da Jamaica à capital maranhense

Cristiellen Sousa

Desenvolvido originalmente na Jamaica, o ritmo suave, mas ao mesmo tempo dançante, chegou ao Brasil nos anos 70 e adquiriu características específicas de acordo com cada região do país. No Nordeste, a cidade de São Luís do Maranhão é conhecida como a "Jamaica brasileira" devido aos inúmeros espaços onde esse gênero é ouvido. Dessa forma, além de um simples entretenimento, o reggae também se transformou em símbolo de cultura e identidade do estado.

Ritmicamente, esse estilo musical se assemelha a uma expressão da cultura popular local, o Bumba-meu-boi, que mistura aspectos da cultura indígena, africana e europeia. Mas, até hoje, não se sabe exatamente quando e como ele chegou em solo maranhense. Alguns dizem que a estrada de ferro de Carajás, fluxo migratório entre Maranhão e Pará, contribuiu nesse processo já que os ritmos caribenhos, como a lambada e o merengue, predominavam nessas duas regiões. Outros acreditam que as ondas de rádio foram as responsáveis pela captação do som do reggae e ainda existem relatos que associam sua vinda aos LPs trazidos em navios que aportavam na capital.

Apesar de todas essas histórias, o certo é que ao longo dos anos, São Luís passou por etapas de socialização, identificação e apropriação desse gênero. A música, dançada individualmente em seu país de origem, ganhou a sensualidade da ginga maranhense e passou a ser dançada em pares. "Aqui é mais gingado de pé no chão, bailado na cintura, sem pular muito. O estilo 'agarradinho' é o preferido", contou João Fábio Soares de Araújo, professor e também vocalista da banda Filhos de Jah.

Os nomes das canções foram adaptados do inglês para o português, de acordo com a proximidade dos fonemas e, além disso, houve a criação de uma linguagem própria do regueiro: a palavra "magnata", por exemplo, referia-se aos empresários dos grandes clubes de reggae e das radiolas (aparelhos de som gigantescos), considerados os principais meios de disseminação desse som.

O reggae rapidamente caiu no gosto popular, tornando-se o estilo musical internacional preferido nas periferias da capital maranhense. Por esse motivo, muitas vezes era associado a algo marginalizado por grande parte da população. Esse cenário se modificou apenas em meados de 1980, quando começou a ganhar espaço nas mídias locais, comprando horários em rádios e TVs. Juntamente aos eventos e produtos, sua identidade foi veiculada e difundida para um maior número de pessoas que, a partir disso, passou a aceitá-lo como expressão cultural.

"Eu tinha apenas 9 anos e adquiri uma visão meio preconceituosa do reggae. Aquilo me assustava, mas acho que o medo era normal, já que eu era criança e fui criado em uma família de pastores. Aos 16, fui em uma festa e não entendia porque uma música que eu odiava, fazia meu corpo se mover no ritmo e contra a minha vontade. Tentava me esconder dos conhecidos na parte mais escura do salão. Eu hesitava, mas a melodia e o grave da música me dominavam. Era algo estranho e inexplicável, eu gostei. Desde então, o reggae contribuiu muito na minha vida, pagou minhas formações acadêmicas e ajuda a manter minha família e pagar as contas", destacou Araújo.

Além das radiolas e das equipes de vinil, que ainda tocam as músicas direto dos LPs, muitas bandas e cantores investiram nesse segmento. Exemplo disso é a banda Filhos de Jah. O grupo surgiu em dezembro de 1998 e recebeu esse nome devido a influência cristã do vocalista (Filhos de Jah = Filhos de Deus). Em 2002, foi uma das cinco bandas selecionadas pela Rede Globo para representar a Região Nordeste e integrar o projeto "O novo som do Brasil", criado e divulgado pelo Jornal Hoje.

Toda essa visibilidade permitiu que a banda transitasse pelo circuito alternativo do país e hoje, com quase 20 anos de história, ainda cativa o público mesclando músicas autorais e covers em um repertório variado, indo desde os clássicos do roots (reggae de raiz) às canções autorais (nacionais, misturando o reggae atual com o estilo jamaicano da década de 70/80). "Assim como o axé está na Bahia e o samba no Rio, o reggae está no Maranhão. Durante muito tempo, o público geral preferia o reggae feito por DJs e radiolas, mas nesse ano o movimento de banda voltou muito forte, o público voltou a ir às festas", contou o músico Tainahakan Santos.

Além dos shows e apresentações, a Filhos de Jah também desenvolve projetos voltados para questões sociais, educativas e culturais. "Já não somos somente uma banda. Desde que passamos a atuar nesses projetos, começamos a agenciar outros artistas do gênero e, agora, também teremos um bloco de carnaval. É uma forma de devolver à comunidade o que a cultura e a educação nos proporcionou", ressaltou Araújo.

Dessa forma, percebe-se que muitos viram no reggae uma oportunidade de emprego e investimento. Com o passar dos anos, esse segmento foi conquistando cada vez mais espaço e importância no estado, principalmente por não se resumir apenas à música, mas por estar articulado a um contexto maior, envolvendo todos os campos da sociedade. Por esse motivo, a Secretária Municipal de Turismo - SETUR e a Comissão Integrada do Reggae e Turismo - CIRT vêm tentando promovê-lo como produto turístico, com o objetivo de fortalecer sua identidade e valorizar ainda mais os costumes locais.
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