Zero
Depois de 6 meses de investigação e longos momentos de introspeção nasce desta primitiva fase de desenvolvimento, Zero, projecto que ao longo do tempo foi-se confundindo com a personalidade do autor e com uma personalidade alheia, fruto de um trabalho introspectivo da mente do autor, uma mescla de memórias, invenções e sonhos perdidos.
Desta situação chegamos a um ponto de tudo e nada, nada e tudo.
Este estado de incerteza proporciona a lua-de-mel entre conexões sinápticas e fibras protoplasmáticas.
É criada então uma cronologia, embora que incerta do percurso de um ser com sentimentos semelhantes aos do ser Humano, com medos, incertezas, convicções e vontades, vai desde a vida à morte, encontros e desencontros com a personalidade e a tentativa de se superar a si mesmo.
Sendo uma obra com várias referências a culturas primordiais, mas também contemporâneas, que no fundo definem a personalidade do autor tanto a nível artístico como pessoal.
 
 

ZERO
 
Estou doente… 
Estou doente porque estou a crescer! 
Estou doente porque vou morrer! 
Estou doente porque sei que estou, 
Porque o tempo não pára,
Porque o passado é apenas uma chama que enfraquece cada vez que me lembro. 
Mãe, eu não quero morrer, 
Eu tenho medo do medo e de envelhecer! 
Tira-me desta melancolia sádica, 
Deste tormento dramático, 
Desta sombra que me persegue quando me deixas sozinho. 
Olha para eles que se riem de mim, 
Porque sou assim! 
Porque tenho medo das máscaras que me fazes usar, 
Que fazes chorar, que fazes cantar,
Mas não fazes sorrir. 
Manténs o raciocínio irracional e não me dás prazer. 
A minha expressão mantêm-se inabalável. 
Não proporcionas nada! 
Porque quando matas, eu não sinto, 
Porque quando matas, eu minto, 
E só sinto a dor sozinho, 
Quando a sombra me atormenta. 
Estás-me a por de modos, 
De jeito, sem feito, 
De quatro, sem fato. 
Deixa-me e ignora-me, 
Não me ligues, nem me estorves, 
Sai de mim! 
Os meus sentimentos são do fim! 
Sai da frente da minha percepção! 
Deixa-me olhar a realidade liquidificada, 
As gotas de água, de vinho, 
Criadas no inferno, 
Produzidas no Minho. 
Não me deixes divagar! 
Mãe, eu já pedi! 
Mantém-me sóbrio e focado nesta missão, 
Que eu vou para o outro lado.

Cheguei ao outro lado… 
Mas…
Queria que um dia, 
Nunca! 
Tivesse saído da barriga de uma espiga
Nunca! 
Nascesse mumificado com mirra, 
Ao raio de sol e do pénis de um estiva.
No entanto, 
É assim que há-de ser esta vida…
Que seja, 
Mas não nesta casa…
Saí de casa, 
Já passava da madrugada. 
Saí, 
Porque não suportava a facada que me tinham dado, 
E porque já não suportava o ar... Que estava a ser respirado! 
Eu sempre fui um rejeitado, 
Ela prometeu-me o que não tinha, ou o que não queria dar, 
E a partir desse dia esse foi o meu fado.
A Aurora imaculada, cheia de graça e bondade,
Havia trazido aquela divindade, 
E esse título foi decorado de maldade. 
A Aurora prometeu um dia de sol, 
Mas toda a gente sabe como é a Aurora, 
Ela não passa de uma mundana, 
Mentirosa! 
Aquela desgraçada! 
Trouxe-me 6 meses de trovoada!!  
6 Meses sem dormir, 6 meses de agonia, 
Como o Pedro. 
Agora costumo ficar por casa, 
Onde a casa não é casa, 
Onde consigo ver a Aurora do cimo do monte 
E chamar-lhe desgraçada!!  

Nunca pensei ver de novo o amanhecer, 
Acontece, é que…
Amanheceu! 
Amanheceu mesmo! 

Hoje... 
Acordei com pélo, 
De cada nervo que faz chinfrim,
Há o que me fere! 
Hoje vou poder cortar,
Hoje...
Vou cortar como nunca cortei, e vou cheirar bem! 
Não me olhes assim, 
Eu uso pozinhos de prilim pin pin!
Hoje...
O dia não há de ter fim, 
De tarde... 
De certo haverá recompensa,
Pelo que aconteceu esta manhã.
A essa hora...
Ofélia!
Haverei de ter asas! 
E o sol resume-se aquilo que eras… 
PÁRA! 
Sentei-me no banco... 
Onde elas se juntavam em bando, 
Corri riscos! 
AH, pois claro que corri, 
Aquele banco...
Não era um banco, 
Naquele banco, 
Existiam histórias cravadas na tinta mal pintada, 
Na madeira rachada. 
O sol estremece os últimos raios, 
De seguida 3 vultos… 
Era o bruno, 
O Bruno da calçada, 
Das caminhadas na madrugada. 
Não! 
Hoje não vou! 
Hoje!
Haverá uma namorada,
Ainda antes da alvorada. 
Hoje! 
Os meus olhos não vão brilhar dessa forma, 
Porque hoje acordei com pélo! 
E lá se foi o Bruno da calçada, 
Os 3 numa lufada. 
(Que vida airada!) 
Quanto á namorada, 
Ela tinha fugido numa jangada. 
Ala arriba! Para outra jornada! 
E eu... 
Ala arriba! Pela estrada, 
Cheio de pélo!
Mas nada de namorada...
De novo aquela desgraçada!

Sinto o frio, do suor que escorre na minha cara, 
Como um rio, 
Que sem margens, inunda de terror os Mingos. 
Depois de um sufoco, asfixiado pelo travesseiro de pena, 
O suor inunda o meu corpo e as entranhas, 
Onde jazem montanhas. 
Um vulto de mulher, caída na ressaca, 
Consome-me...
Com uma imagem desfocada, 
As minhas mais profundas ligações dizem, 
Um fantasma! 
Um fantasma! 
Do passado... 
Das mulheres que não passaram, 
Não deixaram!
Não havia imagem?
Elas inundavam-me! 
O rio nunca teve margem. 
O chocolate... 
Nunca o tive realmente! 
Nada! 
Só o choro de um amado, 
Forçado! 
Os que se aproveitaram da inocência, 
Lamberam o prato de Adão, 
Comeram a maçã da Eva! 
Raios parta a Eva! 
3 vezes me rondou, 
3 vezes pecou, 
Soltou um grito, 
Diz que me roubou! 
Nada de choro, 
Haviam nascido dois pintos azuis, filhos de gatos roxos. 
Costumavam passar debaixo da escada, na hora que batia a trindade. 
Sacanas! 
Levaram-se-me o Abade, 
Sempre soube que ele era um cobarde. 
Filho da puta! 
Há-de pagar o grito de agrado que a Eva me tirou, 
Chocolate!

Depois de tanta agonia...
O meu pai subiu do inferno. 
Perguntou para onde ia?

Olha para onde vamos, 
Olha onde estamos, 
Olha como desvaneces! Na perdição... 
Da mente confusa, suja como a tua língua! 
Sem coração, 
Com pigmentos brancos, da tua última refeição. 
Aqui onde chegamos, 
Existem animais debaixo dos pés. 
Existem Zés caídos...
Aprisionados pela tua língua, 
A quem deixaste o sabor amargo da vida, 
O sabor de uma morte precoce, 
Com tosse... 
E a dor do fumo inalado em outras noites. 
­– Mizéééé! 
Chama o homem anjo. 
Que do fundo de um poço,
Luta... 
Para sustentar a casa de água e calcário, 
Que forra barrigas com fome. 
Da janela ao lado, 
Vem um som eléctrico... 
Um instrumento desconhecido...
Naquela primavera era comum, 
Diziam que morrera um.

Passou um mendigo e disse: 
­– O que conta é o que fazemos enquanto somos matéria, 
O que conta... 
Nem sempre é aquilo que somos! 
– Ponto! (Disse eu) 
– Isso já fomos!

Morre por morrer!
Morre por viver! 
Mata tudo o que te alcança, 
Mata tudo o que dança! 
Nada disto há-de parar!
Nada disto há-de mudar! 
O sentimento que és criança, 
Não passa de um sentimento... 
Com esperança, 
Um sentimento que não é correspondido, 
Um sentimento... 
Que é absorvido!
Pelo ódio que tens a essa aliança,
A esse fio que divide a tua demência, 
Da tua experiência... 
Com as outras que te afligiram... 
E nada!
Mas mesmo nada! 
Lembra-te!
Fizeram quando choras-te baba. 
Amordaçaste tudo o que eram sonhos! 
Naquele tempo...
Tudo parecia fácil...
Naquele tempo... 
Nada nos impedia! 
Batemos no fundo,
Voltamos a bater! 
Nós sempre soubemos como era o fundo! 
E mesmo assim puxávamos uns aos outros... 
Para um fundo ainda mais fundo, 
Nada nos impedia, 
Ninguém se ressentia, 
Ninguém se esqueceu, 
Mas deixaram o Mar leva-lo...
Como um judeu.

Eu e Aquele... 
O que disse: 
Eu sou o Sol! 
Fomos experimentar o céu, talvez ficar…

Hoje não escrevo! 
O cheiro que trago comigo, é o cheiro de um faminto, 
Que me encheu de riqueza e absinto. 
Lá fora os humanos são como paus de estaca afiados, 
Prontos para matar os que nasceram aleijados. 
Eu sempre disse isso, mas tu nunca quiseste ver, 
Houveram os dias em que me envolvias nos teus sonhos, eu acreditava, 
Deixava-me levar. 
Mesmo que o meu consciente soubesse a verdade, 
O inconsciente eras tu. 
Lá andava eu cheio de vaidade, 
Mas eu sempre disse, e tu sabias, 
Os humanos eram como urtigas!
Mas dizias sempre que não, 
Eu dizia que fugíamos para o Japão, 
Aqui não dava, aqui morria. 
Aqui os humanos perseguiam-me, 
E logo vi, nem aqui, nem no Japão! 
Por isso, a partir de hoje morri.
Ao 3º dia renasci.
Voltei com perguntas e vontades…
Mas o quê? 
Os homens não sabem do quê? 
Da sabedoria e burrice eterna que nos amaldiçoa a cada futuro que passa? 
Não me estorvem nem me levem! 
Deixem me apenas apanhar sol sentado na mesa do banquete. 
ZERO! 
Indiferente entre o céu e o inferno, 
Serei sempre livre nas entranhas da minha mente.

Esta noite fugimos dos medos,
Esta noite partimos-lhe os dedos
Embebedamos os sonhos em falsa realidade,
Em falsa felicidade, putrefacta maldade,
Insanidade! 
O punhal que rasga a mente dos homens fracos,
Dos homens bons, dos meus irmãos.
O barqueiro há-de esperar, não será desta que vamos chorar.
Ou será? 
Decerto o punhal rasgou-me os olhos,
Decerto sou eu.
As luzes já vão altas, 
É ali que eu vivo, deixe-me aqui.
Obrigado.
Eu ainda não estou preparado.
Zero
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Este projecto, desenvolvido para a unidade curricular de Ante-Projecto, tem como objectivo abordar algumas das principais temáticas do curso de D Read More

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